segunda-feira, 31 de julho de 2017

Uma árvore à Beira do Caminho


Uma árvore à Beira do Caminho 

Perto de Espinho havia uma árvore 
havia uma árvore à beira do caminho 
E havia um buraco naquela árvore 
perto de Espinho. 

(E o povo sabia que havia um buraco 
naquela árvore à beira do caminho.) 

Mas quando vieram os embuçados 
à procura dum médico em terras de Espinho 
o povo calou-se não disse nada. 
(E o povo sabia que havia um médico 
naquela árvore à beira do caminho.) 

Esta é uma história que todos sabem 
em terras de Espinho. 
Esta é história duma árvore 
à beira do caminho 

Era noite cerrada noite negra 
era noite de morte no caminho. 
E de repente chegaram os embuçados: 
procuravam um médico em terras de Espinho. 

Era noite sem lua noite de emboscada 
noite de um homem não andar sozinho. 
Por isso o povo não disse nada: 
era noite de embuçados no caminho. 

Disseram ao povo que havia um ferido. 
Mostraram as mãos: seria sangue? seria vinho? 
E ninguém foi chamar o médico escondido 
naquela árvore à beira do caminho. 

Era noite sem lua noite de sangue 
era noite de esperas no caminho 
Embuçados chegaram. Embuçados partiram 
Procuram um médico em terras de Espinho 

Já corre um mensageiro para aquela árvore 
à beira do caminho 
Há embuçados. falaram dum ferido 
Mas o sangue que vimos era vinho 

Já o médico sai do seu buraco 
naquela árvore à beira do caminho. 
(Ai a noite sem lua 
aí o sangue tem a cor do vinho) 

Catorze balas o esperavam 
catorze balas o mataram nessa manhã em Espinho 
as mãos do povo vinham florir 
aquela árvore à beira do caminho. 

Mas todos os anos na mesma manhã 
em que o sangue corre nessa aldeia de Espinho 
as mãos do povo vinham florir 
aquela árvore à beira do caminho. 

Mas no dia seguinte no mesmo dia 
em que havia uma árvore (perto de Espinho) 
as mãos do povo vieram plantar 
outra árvore à beira do caminho. 

De quando em quando voltam os embuçados 
e cortam a árvore do povo de Espinho. 
Mas há sempre alguém para plantar 
outra árvore à beira do caminho.

(dedicado ao Dr. Prata - Antonio Carlos Ferreira Soares
assassinado pela PIDE em Julho de1942)